quinta-feira, 20 de março de 2008

Gmail - FWD: Viagens insólitas

Viagens insólitas

Lançado no Reino Unido, livro compara as práticas homossexuais no islã e no Ocidente

PAUL BURSTON

Como acontece com muitos ocidentais, meus conhecimentos sobre o mundo muçulmano são limitados. Minha única experiência em primeira mão diz respeito a uma viagem a Dubai, onde o homossexualidade é ilegal e o clima de homofobia é dominante. Como todo mundo, já ouvi as histórias de terror vindas do Irã e da Arábia Saudita.
Portanto, devo confessar que, quando me vi diante de um livro intitulado "Gay Travels in the Muslim World" [Viagens Gays no Mundo Muçulmano, org. Michael T. Luongo, ed. Routledge, US$ 19,95, R$ 33], minha primeira reação foi pensar "para quê?". Por que não simplesmente viajar para outro lugar?
A realidade, é claro, é que aquilo a que comumente nos referimos como "o mundo muçulmano" não é algo monolítico. Como mostra esta coletânea de histórias da vida real, existem muitas maneiras de ser muçulmano.
Há a história do simpático rapaz judeu que vai viver na Mauritânia, na África, e transa com homens locais, nenhum dos quais tendo se identificado como sendo gay. Há o homem em Bangladesh que percorre os pontos quentes locais e descobre um mundo de prostituição e quartos alugados por menos de US$ 1 por hora.
Há o próprio editor no Afeganistão, onde se surpreende ao descobrir que, mesmo sob o regime do Taleban, aconteciam cerimônias de casamento entre gays em Kandahar.
E há o serviço militar prestado por um soldado gay no Iraque e seu comovente encontro com um homem a quem chama de "o iraquiano gay".

Identidade
Luongo provavelmente discordaria da idéia de um "iraquiano gay". Em sua introdução, destaca que "existe uma diferença tremenda entre os modos como a homossexualidade é expressa no mundo ocidental e no mundo islâmico".
"Para simplificar uma questão muito complexa, na Europa, nos EUA e em lugares sob a influência ocidental, o desejo e os atos homossexuais se tornam a própria definição de uma pessoa: criam uma identidade que a separa do resto da sociedade.
Em boa parte do mundo islâmico, o desejo e os atos homossexuais são simplesmente um aspecto entre outros, algo que as pessoas fazem, mas não algo que define uma pessoa mais que qualquer outra característica sua."
Devo dizer que esse argumento não me convence inteiramente. As pessoas que se identificam como gays não necessariamente se isolam do resto da sociedade, não mais do que as pessoas que são muçulmanas automaticamente se distanciam das que não o são.
Muitos gays vivem integrados de maneira feliz com seus amigos e familiares heterossexuais, assim como muitos muçulmanos vivem integrados às comunidades maiores em que vivem. E, pelo menos em cidades como Londres, existem homens e mulheres que são tanto muçulmanos quanto abertamente gays.
Repressão
A recusa da identidade gay não é expressão de livre escolha, mas sintoma de opressão. Imagino que algo semelhante deva acontecer em países mais repressivos, em que as paradas de orgulho gay são proibidas e a homossexualidade é um tabu tão grande que sua própria existência é negada. Há poucos meses o presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad declarou diante de uma platéia universitária em Nova York: "No Irã não temos homossexuais como vocês têm em seu país".
E pode ser que realmente não os tenham. Talvez tenham homossexuais que têm medo demais para assumir publicamente sua condição, como fazem os americanos, e que optam por enxergar-se como "homens que transam com homens", porque, francamente, essa é sua única chance de sobrevivência.
Mas eles sobrevivem, e suas histórias são uma leitura esclarecedora. Este livro não me levou a mudar meus planos para as férias, mas me fez refletir seriamente sobre o significado de ser gay e muçulmano. E isso com certeza constitui um passo na direção certa.

Este texto foi publicado no "Independent". Tradução de Clara Allain .

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